Textos das questões
Texto I
As janelas
Do vermelho ao verde todo amarelo morre
Quando cantam as araras nas florestas natais
[...]
Aves chinesas de uma asa só voando em dupla
É preciso um poema sobre isso
Enviaremos mensagem telefônica
Traumatismo gigante
Faz escorrer os olhos
Garota bonita entre jovens turinenses
O moço pobre se assoava na gravata branca
Você vai erguer a cortina
E agora veja a janela se abre
Aranhas quando as mãos teciam a luz
Beleza palidez insondáveis violetas
Tentaremos em vão ter algum descanso
Vamos começar à meia-noite
Quando se tem tempo tem-se a liberdade
Marisco Lampreia* múltiplos Sóis e o Ouriço do crepúsculo
Um velho par de sapatos amarelos diante da janela
Tours
As Torres são as ruas
[...]
Ó Paris
Do vermelho ao verde todo jovem perece
Paris Vancouver Hyère Maintenon Nova York e as Antilhas
A janela se abre como uma laranja
O belo fruto da luz
Texto II
O domador
Alturas da Avenida. Bonde 3.
Asfaltos. Vastos, altos repuxos de poeira
sob o arlequinal do céu ouro-rosa-verde...
As sujidades implexas do urbanismo.
Filets de manuelino. Calvícies de Pensilvânia.
Gritos de goticismo.
Na frente o tram da irrigação,
Onde um Sol bruxo se dispersa
Num triunfo persa de esmeraldas, topázios e rubis...
[...]
Mário, paga os duzentos réis.
São cinco no banco: um branco,
Um noite, um ouro,
Um cinzento de tísica e Mário...
Solicitudes! Solicitudes!
Mas... olhai, oh meus olhos saudosos dos ontens
Esse espetáculo encantado da Avenida!
Revivei, oh gaúchos paulistas ancestremente!
E oh cavalos de cólera sanguínea!
Laranja da China, laranja da China, laranja da China
Abacate, cambucá e tangerina!
Guardate! Aos aplausos do esfusiante clown,
Heroico sucessor da raça heril dos bandeirantes,
Passa galhardo um filho de imigrante,
Louramente domando um automóvel!
Texto IIl
o capoeira
— Qué apanhá sordado?
— O quê?
— Qué apanhá?
Pernas e cabeças na calçada
(Oswald de Andrade. Poesias reunidas. 5. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978. p. 94.)
1. À primeira vista, a linguagem modernista causa grande estranhamento, mesmo para o leitor atual. Uma das razões desse estranhamento resulta do uso da técnica da simultaneidade de imagens, isto é, a junção de elementos aparentemente sem relação uns com os outros. Essa técnica dá a impressão de fragmentação da realidade, como se uma câmera estivesse captando flashes.
a) Identifique exemplos do emprego dessa técnica nos três poemas.
Todo o texto I utiliza essa técnica; No texto II, o espectador, a bordo do bonde, vai enumerando imagens da cidade (note-se a ausência de verbos na primeira estrofe); todo texto III compõe-se de flashes de uma cena.
b) Na sua opinião, em qual dos poemas a técnica da livre associação de pensamentos chega a dificultar a compreensão do texto?
Provavelmente, deve-se estranhar mais o texto I, por ser mais radical quanto ao emprego dessa técnica.
2. Outro traço de destaque na arte moderna é o urbanismo ou a modernidade como tema, isto é, a valorização das cidades, do trabalho, das fábricas, da convivência das raças e de situações cotidianas.
Na obra de alguns autores também é valorizada a noção do progresso advindo da industrialização e das máquinas.
a) Em qual ou quais dos poemas é abordado o tema do urbanismo?
Nos três. No primeiro, entretanto, aparecem explícitos os nomes de cidades e lugares; no segundo, há referências à avenida, meios de transporte, arquitetura, asfalto, vendedores ambulantes, etc. Além disso, o poema foi extraído do livro “Pauliceia desvairada”, que é como o poeta chama sua cidade (São Paulo); no terceiro, o soldado e a calçada caracterizam o urbano.
b) Em qual ou quais dos poemas se nota uma visão positiva a respeito do crescimento das cidades?
No texto II. A pontuação deixa explícito o entusiasmo do eu lírico diante dos contrastes, das mudanças sociais e do desenvolvimento tecnológico (do bonde ao automóvel).
3. Outra das propostas dos modernistas é trabalhar com elementos-surpresa, insólitos. Há ainda a inclinação para o humor, a piada, a ironia, o sarcasmo, a irreverência.
a) Quais poemas dão mostras de humor e irreverência?
Nos poemas de Oswald de Andrade e o de Mário de Andrade. A irreverência, no texto III, está não só no plano formal, mas também no plano das ideias, já que o capoeira (pessoa simples, do povo) desafia uma autoridade, que representa o poder. No texto II, um palhaço aplaude o filho de imigrante que supera os “quatrocentões” paulistas, os bandeirantes.
b) Qual (ou quais) dos poemas apresenta(m) elementos-surpresa? Justifique sua resposta com elementos do texto.
No poema de Oswaldo de Andrade, há elementos surpresas, pois demonstra a reação inusitada do soldado com a afirmação "Pernas e cabeça na calçada".
4. Os poetas modernistas eram contrários a regras. Para criar, propunham as “palavras em liberdade”, o que significava não se prender a regras preconcebidas. No lugar da métrica, propunham o uso do verso livre (sem um número predeterminado de sílabas poéticas); em vez de formas fixas, inventavam novas formas a cada novo poema.
a) Observe a métrica dos versos dos três poemas. Eles fazem uso do verso regular ou do verso livre?
Todos fazem uso do verso livre.
b) Qual dos três poemas é composto em estrofes? As estrofes são regulares, isto é, todas têm o mesmo número de versos?
O segundo poema é composto de estrofes. As estrofes não são regulares: há estrofes de quatro, cinco e seis versos.
5. Outra manifestação da proposta de “palavras em liberdade” é o uso diferente da pontuação, de outras regras ortográficas e a busca de uma fala brasileira.
a) Como se dá o uso da pontuação nesses textos?
O texto I não utiliza pontuação. O texto III emprega apenas o ponto de interrogação para dar ideia de frase interrogativa; o texto de Mário de Andrade emprega pontos, separando as imagens que o observador vai captando no decorrer da viagem de bonde; reticências, para indicar que outros aspectos da cidade poderiam ser registrados; e exclamações, que denotam o entusiasmo do observador diante da cidade e de sua diversidade.
b) Que regra gramatical é quebrada no modo como se apresenta o título do poema de Oswald de Andrade?
A do emprego de letra inicial maiúscula na primeira palavra do título, recomendada pela tradição.
c) Que outros traços modernistas podem ser observados na linguagem do poema de Oswald de Andrade?
O desrespeito à ortografia, em formas como “Qué” e “apanhá”, próprias da língua oral, e na busca de um falar brasileiro, como em “sordado”.
6. O modernismo brasileiro recebeu influência de várias correntes artísticas surgidas na Europa no início do século XX; mas, em contrapartida, representou uma retomada do nacionalismo, introduzido em nossa literatura pelos românticos. Que elementos do poema de Oswald de Andrade podem ser associados à valorização da cultura brasileira?
A busca de uma língua brasileira ou da língua portuguesa falada no Brasil e a introdução de uma personagem brasileira, a capoeira, fruto da herança cultural afro-brasileira.